Além do anunciado investimento de EUR 2 mil milhões da China Aviation Lithium Battery (CALB) numa fábrica de baterias em Sines, outros projectos na área das baterias, automóveis e construção estão a reforçar a presença de capital chinês na economia portuguesa.
O ministro da Economia, Pedro Reis, foi o anfitrião no final de fevereiro do lançamento da construção da gigafábrica da CALB que ocupará 92 hectares de terreno da Zona Industrial e Logística de Sines (ZILS). O evento no Técnico Innovation Center, em Lisboa, contou com a presença da “chairwoman” da CALB, Liu Jingyu e segundo o ministro, a CALB trouxe consigo ao evento vários dos seus fornecedores a nível mundial.
No setor da mobilidade elétrica e energias renováveis, destaca-se ainda a recente parceria entre a Greenvolt e a gigante chinesa BYD Energy Storage, uma das maiores empresas fornecedoras de sistemas de armazenamento de energia em baterias elétricas.
O acordo, celebrado através da Greenvolt Power, inclui o design e a operação de ativos na Polónia com uma capacidade instalada total de até 1,6 GWh, e envolve dois projetos em Turosn Koscielna e Nowa Wies Elcka, ambos conectados ao operador do sistema de transmissão de eletricidade polaco e com contratos de fornecimento assegurados para 2028.
As entregas para estes projetos começarão no quarto trimestre de 2025, com conclusão prevista para o primeiro trimestre de 2026, representando um importante passo na estratégia de expansão internacional da Greenvolt no setor do armazenamento de energia.
Jorge Chang, advogado da Melo Alves que faz assessoria a investidores portugueses e asiáticos, referiu ao site noticioso ECO que “o investimento chinês em Portugal aumentou 34% de 2022 para 2023” e que “ao longo dos últimos 20 anos, ultrapassaram os 3.600 milhões de euros”.
Além dos investimentos mais sonantes, “que são estatais e de interesse nacional”, existem outros “menos falados e que também estão cá a operar”, como a empresa China Railway Rolling Stock Corp (CRRC) Tangshan, que fabricou as novas composições para o Metro do Porto, destaca o advogado ao ECO. Chang destaca ainda o acordo entre a Salvador Caetano e a BYD que permite a distribuição dos automóveis da marca chinesa em Portugal.
No setor privado, existe também um forte interesse na construção civil, uma vez que grandes empresas chinesas têm parcerias com a Mota-Engil e a Teixeira Duarte e querem continuar a desenvolver projetos, embora isso implique a necessidade de trazer trabalhadores especializados para Portugal. Esta diversificação de investimentos reflete uma estratégia abrangente que visa estabelecer presença em múltiplos setores da economia portuguesa.
O setor da construção tem sido outro dos palcos privilegiados para a cooperação económica luso-chinesa. Um exemplo significativo é a parceria entre a Teixeira Duarte e o grupo China State Construction Engineering Corporation (CSCEC) para o desenvolvimento de um projeto imobiliário em Oeiras.
Esta parceria concretizou-se através da venda de 50% de uma participada da Teixeira Duarte por EUR 31,1 milhões em 2019, com um impacto estimado nos resultados da construtora portuguesa de cerca de EUR 22,2 milhões. O empreendimento será constituído por diversos edifícios de escritórios, habitação e comércio, integrados num grande parque verde, num modelo que se pretende que seja uma referência de inovação e sustentabilidade.
Nas duas últimas décadas, o investimento chinês em Portugal evoluiu de forma notável, tanto em volume como em diversidade setorial. De uma presença praticamente inexistente no início do século, a China transformou-se num dos principais investidores estrangeiros no país.
Outra colaboração de relevo no setor da construção estabeleceu-se entre a Mota-Engil e a China Communications Construction Company (CCCC), em 2020, através de uma compra direta à família Mota de 23% do capital da construtora nacional, ao preço de EUR 3,08 euros, cerca do dobro da cotação das ações na altura, que se traduziu num investimento de EUR 169 milhões.
Além dos setores energético e da construção, o investimento chinês tem-se diversificado por várias áreas da economia portuguesa. Foi o caso da aquisição pela China National Fisherie Corp (CNFC) de 51% da Marfresco, uma empresa portuguesa de importação e distribuição de camarão e pescado fundada em 1991, em 2016.
Com 21 trabalhadores e uma faturação de cerca de 25 milhões de euros à data da aquisição, a empresa tinha planos para duplicar o volume de negócios nos anos seguintes, beneficiando do acesso direto à matéria-prima através do seu novo sócio, que é considerado o maior armador do mundo com mais de 300 barcos em diversos países. Apesar das elevadas expectativas, a empresa fechou 2023 com o mesmo número de funcionários (21) e com uma faturação de EUR 20 milhões.
O início da intensificação da relação económica entre Portugal e a China coincidiu com a crise financeira global e, posteriormente, com a crise da dívida soberana em Portugal. Entre 2011 e 2014, no auge da crise financeira portuguesa que levou à intervenção da troika, o país precisou de privatizar ativos estatais, abrindo caminho para o início dos grandes investimentos chineses.
Foi neste contexto desafiador para a economia nacional que se estabeleceram as primeiras grandes posições chinesas em setores estratégicos nacionais, num momento em que Portugal necessitava urgentemente de capital estrangeiro para equilibrar as suas contas públicas.
O investimento superior a EUR 2,6 mil milhões da China Three Gorges no final de 2011 na aquisição de 21,35% da EDP, no âmbito da 8.ª fase de reprivatização da elétrica nacional, marcou o início desta vaga. Mas o interesse chinês no setor energético nacional não parou por aí, estendeu-se no ano seguinte à REN por via da aquisição de 25% do capital da REN em fevereiro de 2012 por parte da State Grid por cerca de EUR 287 milhões.
A completar o trio de grandes investimentos iniciais chineses em Portugal, está o grupo Fosun, que entrou no capital da Fidelidade em 2014 através da aquisição de 80% do grupo segurador português à Caixa Geral de Depósitos, que manteve uma participação minoritária de 20%, num investimento superior a EUR 1,1 mil milhões.
Portugal espera uma vaga de investimento chinês na sequência do investimento da CALB, afirmou o ministro da Economia português.
“Estamos numa corrida altamente competitiva pelo investimento externo. Hoje a chairwoman internacional da CALB transmitiu-me que estão cá, nesta mesma sala, fornecedores da empresa que estão a desenvolver produtos e soluções lá, e que estão a considerar vir a investir em Portugal”, disse o ministro Pedro Reis à margem do evento no final de fevereiro, sem revelar, no entanto, os nomes dos fornecedores. “Dizer mais do que isso, seria dar trunfos à nossa concorrência internacional”.
Do lado da comitiva chinesa, Sherry Wei, “general manager” da CALB Europe, garantiu que Portugal é o “hub ideal para distribuir baterias de lítio para o mercado europeu”, com o “ambiente perfeito para a visão da CALB a longo prazo”.
“Este é apenas o início da parceria com Portugal. Não estamos apenas a lançar um novo projeto no país, mas a começar uma viagem de intercâmbio e colaboração intercultural”, garantiu.